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Nova Mutum/MT
O Brasil vive um dos momentos mais tensos de sua política externa desde o início da Nova República. A imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros por parte dos Estados Unidos, anunciada pelo presidente Donald Trump, marca o início de um confronto diplomático direto que pode custar caro à economia nacional e à estabilidade institucional.
As sanções vieram após o Supremo Tribunal Federal (STF) determinar medidas cautelares contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, incluindo o uso de tornozeleira eletrônica, em meio às investigações sobre tentativa de golpe em 2022. Como resposta, Trump classificou as decisões do Judiciário brasileiro como “perseguição política” e sancionou o ministro Alexandre de Moraes, revogando seu visto e o de familiares.
Reação do Planalto: soberania ou provocação?
Em pronunciamento nacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu com firmeza:
“O Brasil é soberano e não aceitará intimidações, nem de fora, nem de dentro.”
Lula classificou a ação americana como “chantagem inaceitável” e acusou aliados de Bolsonaro de traição, ao buscarem apoio externo contra as instituições brasileiras. Entre os citados, está o deputado Eduardo Bolsonaro, que teria articulado com representantes do Partido Republicano nos EUA.
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A crise internacional surge em um momento em que o governo enfrentava queda de popularidade, agravada por críticas à economia e ao aumento de impostos. No entanto, o embate com os EUA provocou um efeito político imediato: a recuperação nos índices de aprovação de Lula, alimentada por um discurso de defesa da soberania que mobiliza parte significativa da opinião pública.
Exportações ameaçadas: impacto nos empregos e no custo de vida
As tarifas impostas pelos EUA atingem setores estratégicos como agronegócio, mineração e manufaturas. Em 2024, os Estados Unidos representaram 10% das exportações brasileiras, em um comércio bilateral que superou US$ 74 bilhões.
De acordo com a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras (ABIEC), mais de 25 mil empregos podem ser afetados, sobretudo nos estados de Mato Grosso, Goiás e Paraná, com impacto direto sobre a cadeia produtiva de carnes e derivados.
Economistas alertam que as tarifas devem:
• Reduzir a competitividade brasileira no mercado americano;
• Pressionar o dólar e desvalorizar o real;
• Aumentar o custo de vida, especialmente para famílias de baixa renda.
O Banco Central já sinalizou a possibilidade de revisar para cima as projeções de inflação, caso a pressão sobre a moeda continue.
Produtos como fertilizantes, eletrônicos e medicamentos importados podem sofrer alta imediata, agravando a situação do consumidor brasileiro.
Europa acompanha e ameaça seguir o mesmo caminho
Além dos EUA, o Brasil corre risco de perder espaço comercial na Europa, que já vinha impondo exigências ambientais mais rígidas nas negociações com o Mercosul.
Parlamentares do Parlamento Europeu manifestaram preocupação com a “escalada institucional brasileira” e indicaram que o Acordo Mercosul-União Europeia pode ser congelado, dependendo da evolução da crise. A imagem internacional do Brasil se fragiliza ainda mais com as críticas ao desmatamento na Amazônia e à instabilidade política interna.
Foto: Tânia Rêgo

Lições de Venezuela, Irã e Rússia
O cenário acende alertas diante de casos recentes em que países enfrentaram embargos e colapsos econômicos:
• Venezuela: Hiperinflação e escassez após sanções dos EUA e União Europeia.
• Irã: Quedas sucessivas no PIB e dificuldade de acesso a produtos básicos.
• Rússia: Redirecionamento econômico forçado após sanções pela guerra na Ucrânia.
No caso do Brasil, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) estima que uma redução de 30% nas exportações para os EUA pode gerar perda de até 1% no PIB nacional em um ano.
Governo sob pressão interna e acusação de “cortina de fumaça”
Setores da oposição e apoiadores de Bolsonaro classificam a reação do governo como “cortina de fumaça” para desviar a atenção da crise interna, com inflação crescente, aumento de impostos e baixa eficiência em áreas-chave como saúde e segurança.
Para o cientista político Ricardo Torres, da FGV:
“A escalada com os EUA favorece a narrativa nacionalista do governo, mas acende alertas sobre os riscos econômicos de transformar política externa em campo de batalha ideológica.”
Nas redes sociais, a hashtag #BrasilVirouVenezuela, ganhou força entre bolsonaristas, em alusão ao temor de isolamento institucional e colapso econômico.
Moeda dos BRICS: reforço de soberania ou provocação geopolítica?
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Outro elemento de tensão é a defesa do Brasil, sob liderança de Lula, por uma moeda comum entre os países do BRICS, em substituição ao dólar em transações internacionais. A proposta, embora apoiada por Rússia e China, encontra resistência na Índia.
Analistas avaliam que a ideia pode reforçar o discurso de soberania, mas agrava o desgaste com os Estados Unidos e aliados ocidentais, sobretudo em um momento de turbulência.
Perspectivas: entre discurso e pragmatismo
O governo Lula enfrenta o desafio de manter a narrativa de soberania sem sacrificar a estabilidade econômica e os interesses da população.
A pressão cambial, o risco de recessão nos setores exportadores e a possibilidade de sanções conjuntas de EUA e Europa exigem diplomacia estratégica, negociação e foco em soluções internas.
“O desafio central será administrar as tensões externas sem comprometer o equilíbrio interno, econômico, político e social.”