Alexandra Lopes/Folhamax
Mato Grosso
"Gostou de se cortar pro papai?". A frase foi dita por um criminoso virtual, integrante de um grupo que induz adolescentes e crianças à automutilação. Trechos de algumas abordagens perturbadoras feitas às vítimas por meio do WhatsApp foram divulgados nesta terça-feira (27) durante as diligências da Operação Mão de Ferro 2, deflagrada pela Polícia Civil. A ação ocorre de forma simultânea em 12 estados, com a participação das Polícias Civis do Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Piauí, Rio Grande do Sul, Sergipe e São Paulo.
Conforme as investigações, os integrantes ainda compartilhavam pornografia infantil, praticavam ameaças e faziam apologia ao nazismo.Em um dos prints, um dos integrantes conversa com a mãe de uma das vítimas. Ele envia uma imagem e diz: "Olha o quanto a sua filha [palavra censurada."
A mãe pergunta quem está falando e encaminha um áudio dizendo que irá denunciá-lo. O criminoso virtual não se intimida e faz ameaças: "Isso. Vai lá na delegacia fazer um boletim de ocorrência contra mim. Enquanto você vai, eu estou fazendo a sua fila de...". A mãe mais uma vez diz que irá denunciar e avisa que o bandido será bloqueado no celular dela e da filha.
O criminoso debocha: "Vai, sua piranha. Você e sua filha são duas piranhas." Em outro trecho, o maníaco obriga algumas vítimas a fazerem algo. No início, ela se recusa, então ele diz: "Vou mostrar sua para a mãe". Ela cede e faz o que ele pediu enquanto o criminoso responde: "Boa, garotinha."
Em outra conversa, o investigado pergunta se a vítima gostou de se cortar "pro o pai" e ela prontamente responde que sim. Em outro prints, o criminoso insiste em fazer uma ligação de vídeo com a vítima, que afirma não poder atender naquele momento.
O suspeito dá um ultimato: "10h30, se você não tiver decidida, vou encaminhar suas mídias pra sua mãe," ameaçou. A vítima pergunta: "Por que você está fazendo isso comigo?" Ele apenas responde: "O tempo passa. A escolha é sua."
Em Mato Grosso, foram cumpridas três ordens judiciais, sendo um mandado de busca e apreensão domiciliar contra uma adolescente de 16 anos na cidade de Sinop, além de dois mandados de busca e apreensão e de internação provisória contra o líder do grupo, um adolescente de 15 anos, em Rondonópolis. O menor apontado como líder do grupo já havia sido alvo da 1ª fase da operação, deflagrada em agosto de 2024 e também da Operação Discórdia, realizada pela Polícia Civil em abril passado.
O cumprimento das ordens judiciais conta com o apoio da 1ª Delegacia de Polícia de Sinop e da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher de Rondonópolis. A Operação integra o planejamento estratégico da Polícia Civil por meio da operação Inter Partes, dentro do programa Tolerância Zero, do Governo de Mato Grosso, que tem intensificado o combate às facções criminosas em todo o estado.
Rede criminosa
As investigações identificaram uma rede de pessoas, incluindo adolescentes, que, de forma articulada, praticava crimes como indução, incitação ou auxílio à automutilação e ao suicídio, perseguição (stalking), ameaças, produção, armazenamento e compartilhamento de pornografia infantil, apologia ao nazismo e invasão de sistemas informatizados, incluindo acesso não autorizado a bancos de dados públicos.
As práticas criminosas ocorriam principalmente em plataformas como WhatsApp, Telegram e Discord, nas quais os investigados disseminavam conteúdos de violência extrema, estimulavam comportamentos autodestrutivos, praticavam coação psicológica, ameaças e exposição pública de vítimas — na maioria, adolescentes — causando sérios danos emocionais e psicológicos.
"O Ministério da Justiça e Segurança Pública, por meio do Laboratório, promoveu a integração operacional entre as Polícias Civis dos estados, possibilitando uma ação coordenada, simultânea e robusta. A troca de informações e o alinhamento entre os estados foram fundamentais para que essa operação tivesse abrangência nacional, visando proteger nossas crianças e adolescentes e responsabilizar aqueles que se escondem no ambiente digital para praticar crimes tão graves", destacou Rodney Silva, diretor de Operações Integradas e de Inteligência da Secretaria Nacional de Segurança Pública, do MJSP.
De acordo com Gustavo Godoy Alevado, delegado adjunto da Delegacia Especializada de Repressão a Crimes Informáticos, "a Operação Mão de Ferro 2 é resultado de um trabalho investigativo minucioso conduzido pela Delegacia Especializada de Repressão a Crimes Informáticos da Polícia Civil de Mato Grosso, em parceria com o Ciberlab do Ministério da Justiça. A deflagração da operação é uma resposta firme e coordenada do Estado à violência digital contra crianças e adolescentes."
O nome da operação simboliza a resposta firme, rigorosa e coordenada do Estado brasileiro no enfrentamento de crimes de alta gravidade praticados no ambiente digital, especialmente aqueles que atingem crianças e adolescentes. Representa o papel da lei e do sistema de segurança pública no combate à exploração digital, violência psicológica e à disseminação de conteúdos de ódio e autodestruição.