Wesley Moreno com informações do Estadão
Nova Mutum/MT
O governo federal finaliza uma Medida Provisória (MP) que deve provocar aumento imediato nas contas de luz da classe média para viabilizar a ampliação da tarifa social de energia. O plano prevê isenção total para famílias de baixa renda que consomem até 80 kWh por mês e descontos proporcionais para aquelas com consumo de até 120 kWh e renda entre meio e um salário mínimo por pessoa.
A estimativa oficial é beneficiar cerca de 60 milhões de brasileiros, com um custo estimado de R$ 3,6 bilhões. No entanto, segundo a consultoria Volt Robotics, o impacto real pode chegar a R$ 7 bilhões — valor que será repassado diretamente aos consumidores residenciais e ao pequeno comércio, que compõem o chamado mercado regulado.
“Para a grande maioria da população, o próximo ano será de aumento no custo da eletricidade. O benefício para quem migrar ao mercado livre só virá em 2028”, afirma Donato Filho, diretor da Volt Robotics.
A nova medida ocorre em meio à queda de popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, agravada pelas denúncias de fraudes no INSS. O Palácio do Planalto vê na MP uma “agenda positiva” social, mas a pressa em aprovar a medida gera desconforto entre agentes do setor elétrico.
Quem paga a conta?
A conta da tarifa social será paga com os encargos cobrados dos consumidores regulados, que já são os que mais sofrem com os aumentos provocados pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) — fundo que financia programas como Luz para Todos e subsídios a fontes renováveis. Em 2024, o custo da CDE deve atingir R$ 40,6 bilhões, o equivalente a 13,83% da tarifa residencial.
O governo promete que, no futuro, parte dessa conta será redistribuída para os grandes consumidores industriais. Mas isso só deve ocorrer de forma significativa após 2038, com uma transição gradual de mais de uma década. Até lá, a classe média seguirá pagando a conta mais alta.
Migração para o mercado livre: só em 2028
A promessa de compensação ao consumidor regulado é a possibilidade de migrar para o mercado livre de energia, onde é possível escolher fornecedores com tarifas mais competitivas. Porém, esse benefício só será acessível a consumidores residenciais a partir de meados de 2027, com efeito prático apenas em 2028.
Enquanto isso, a única medida com efeito imediato para aliviar a conta dos pequenos consumidores seria redistribuir os custos da energia gerada pelas usinas nucleares Angra 1 e 2 — encargos hoje pagos apenas pelos menores consumidores. Mesmo assim, o impacto seria limitado: uma redução de até R$ 2 bilhões por ano, considerada “irrelevante” por especialistas do setor frente ao impacto total da nova tarifa social.
Corte em subsídios para energia limpa
Outra frente da MP é o fim dos subsídios para novos projetos de geração de energia limpa (solar, eólica, biomassa e pequenas hidrelétricas), que atualmente recebem descontos de 50% no uso das redes de transmissão. O corte valerá apenas para contratos novos — os existentes permanecem com o benefício.
A estimativa é de uma economia de R$ 7,3 bilhões por ano, segundo a consultoria PSR Energy. No entanto, o setor de energia renovável já articula resistência no Congresso, alertando para o risco de inviabilizar novos empreendimentos e abrir brechas para disputas judiciais.
“Não é papel do consumidor de energia elétrica financiar programas sociais. Essa política deveria sair do Orçamento da União”, argumenta Rodrigo Ferreira, presidente da Abraceel (Associação Brasileira das Comercializadoras de Energia).
Conclusão
A proposta do governo Lula mira justiça social ao ampliar benefícios para a população mais vulnerável, mas transfere a conta para quem já paga mais caro pela energia. As compensações prometidas virão apenas a longo prazo, enquanto a classe média deve arcar com aumentos imediatos, num momento de pressão econômica e política.